O grande dia chegou. Léo estava excitado, de fato. Não foi para o trabalho. Sequer disse nada ao pessoal. Apenas não foi. A única pessoa que sabia o que ele haveria de fazer naquela segunda-feira era Carla, a garota do almoxarifado – que todo mundo na empresa (até uma supervisora) comeu, inclusive ele. Mas entre eles o lance era diferente. Rolava algo muito próximo do amor. E Carla gostava tanto de Léo que, muito embora ela desaprovasse o que iria acontecer naquela manhã com o amigo de trabalho e de cama, ainda assim ela procurou compreender. No íntimo não aceitou, mas procurou compreender. Era nela que Léo pensava naqueles últimos instantes, sentando em sua cama, encarando o chão. Tinha tomado uma boa dose de benzodiazepínico com álcool, para aliviar um pouco a tensão. Daqui a poucos instantes pegaria o metrô para a clínica. O metrô passava a algumas centenas de metros do cubículo onde morava. Olhava para o relógio, e aqueles eram os últimos momentos que faria aquilo na sua vida. O telefone tocou. “Deve ser o pessoal da empresa”, pensou. Léo adorou não ter que pegar o gancho… mas… bom, podia ser outra pessoa. “Sim”, pensou, “e se for outra pessoa?” Léo estendeu a mão e pegou o fone. Era Carla. Ela chorava.
-Você vai levar isso adiante? – disse ela.
-Vou Carlinha. E mesmo que quisesse voltar atrás, já paguei a maior grana.
-Você só precisava de uma mulher, Léo, uma mulher bem bacaninha… Tipo eu, assim…
Ambos riram.
-Mas é sério – continuou Carla -, um amor resolve muitas coisas.
-Você tem um amor? – perguntou Léo, num tom meigo, mas ao mesmo tempo mordaz.
-Não… – disse ela titubeando.
-Você só quer foder, Carlinha, e fica falando em amor. Eu gosto de você, mas a gente nunca ia dar certo.
Houve uma pausa do outro lado. Em seguida, Carla disse:
-No dia que eu achar um cara bacana eu me conserto.
-Toda puta fala isso.
-Eu não sou puta, putas cobram. Eu transo por gosto.
-Tá, tudo bem, você entendeu.
Outra pausa.
-Não faça isso Leozinho, por favor, vou sentir tanto sua falta… seu jeito, suas piadas, essa sua cara de sono, de falta de gosto como tudo… isso me deixa tão molhadinha… kkkkkkk…
-Você ficará molhadinha por outras razões, umas tão nobres quanto, outras nem tanto.
-Nossa, esse seu humor é tão refinado, é tão gostoso… Não se vá, meu lindo, não se vá.
Léo suspirou do outro lado da linha. Carla era uma mulher de sexualidade plenamente amadurecida, repleta de artifícios, dotes, mandingas, magias, amuletos e outras coisas mais. Ela adorava deixar os cabelos pretos caírem até o meio das costas. Tinha a pele branca, olhos azuis e lábios grandes e finos. Seus quadris eram largos, mas bem proporcionados. Léo sentiria falta de a segura-los nus, com força, durante o amor. Em compensação seu seios eram diminutos, muito pequenos, pequenos botões cor-de-rosa. Ela usava os mesmos sutiãs de sua prima de onze anos de idade.
-Vou sentir sua falta, lá onde eu estiver – disse Léo engolindo em seco.
-O que eu não faria pra você mudar de idéia.
-Você é especial, minha gostosa… Continue dando bem essa sua buceta, que você será uma mulher muito feliz.
Riram.
-Mas é preciso que eu parta – disse Léo, batendo o telefone após consultar o relógio.
O aparelho tocou até ele tomar a rua. Carla largou as incumbências do almoxarifado e saiu.
Léo vestiu seu casacão. Fazia frio. Andou meia hora até o metrô. Quando lá chegou, viu Carla.
-O que você faz aqui? – perguntou ele, muito naturalmente.
-Posso te dar um abraço? – ela soluçava. – O último?
Léo, sem nada dizer, foi até ela. Abraçaram-se por um longo tempo. Tempo suficiente para o metrô chegar.
-Já vou – disse ele.
-Não, meu amigo, não vá, por favor…
-Vou, garota. Tenho que ir.
Finalmente, Léo entrou no metrô, a caminho da clínica de suicídio, onde tomaria uma injeção letal, paga vários meses antes. Aquela era uma febre que se estendia de ponta a ponta do globo. Milhões e milhões de pessoas, por todos os cantos, pagavam pequenas fortunas para deixar de viver através de uma injeção letal, algo que, nos primórdios se era reservado apenas aos piores bandidos. Carla chorou naquela tarde, pelo seu amigo Léo, e mais ninguém. E o mundo seguiu, sem Léo, sem sentir sua falta, sem que nada, absolutamente nada, ficasse diferente.